O ego e a escalada
Há alguns anos a palavra ego tornou-se vocabulário comum em meios não especializados, fora da psicologia. De maneira informal, fazemos, muitas vezes, referência ao ego quando percebemos demasiado orgulho, arrogância ou vaidade no comportamento ou na maneira de ser de um determinado escalador. “O cara se acha o tal, o cara é puro ego.”, “só escala ou está no meio para encher seu ego”. Esta alusão ao termo, no entanto, é parcialmente correta, trazendo de seu significado apenas uma parte da história. Para falarmos das possíveis influências e relações entre o ego e a escalada é necessário, em primeiro lugar, discorrermos, de forma breve, sobre a definição de Ego.
Para a psicanálise, uma das correntes mais popularizadas da psicologia, acadêmica e cientificamente aceitas, o ego é peça central na estrutura da personalidade do sujeito. Segundo esta teoria, trata-se do núcleo da personalidade. Este centro de “o que sou”, ou de “quem eu sou”, recebe influências de duas correntes de energias psíquicas o Id (forças Instintivas) e o Superego (instância moral/cultural/julgadora). Também, de acordo com esta teoria, o ego exerce o controle das experiências conscientes e regula as ações entre a pessoa e o meio, ocupando, portanto, a posição do centro de referência para todas as atividades psicológicas e qualidades da personalidade. Segundo a psicanálise, através do Ego aprendemos tudo sobre a realidade externa e orientamos nosso comportamento no sentido de evitar estados dolorosos e ansiosos e buscar estados de plenitude e satisfação.
Se consideramos o conceito acima, voltando-nos para a escalada, para termos a capacidade de desfrutar e ter prazer, mantermo-nos seguros e vivos e evoluir nos territórios verticais e montanhosos, necessitamos, com certeza, um ego saudável, um ego maduro e, arriscaria dizer, um ego forte. Minha tese de que, mesmo necessitando um Ego maduro e forte para escalar, com a prática da própria escalada podemos fortificar e amadurecer nosso Ego. Escalar pode nos ajudar a forjar aspectos de nossa personalidade, como a auto estima, a consciência corporal, a auto imagem, a sociabilidade, introversão, a extroversão e o caráter. Desde esta ótica, a escalada funciona perfeitamente como via de auto conhecimento. A escalada também pode fazer-nos acreditar em nossas capacidades para transpor obstáculos físicos e mentais. Através de sua prática, emoções como medo, ódio, alegria, paz, inveja, êxtase, podem ser catalisadas e potencializadas.
Finalmente, de forma muito curiosa, as descrições que escutei de diversos escaladores em meu trabalho de conclusão de curso, “Escalada: uma via de auto conhecimento”, sobre o prazer de escalar, assemelham-se com as descrições de escaladores de referência em todo o mundo. Curiosamente também, estas raras e preciosas experiências de êxtase, potencialmente proporcionadas pela escalada, são bastante semelhantes a descrições de estágios que antecedem a “experiências místicas” descritas em tradições milenares como Yôga e Zen Budismo. Estaremos falando da possibilidade de transcendência do Ego através da escalada? Quem sabe, mas antes disso estou seguro de que, muito, realmente muito trabalho de conhecimento, fortalecimento e amadurecimento de nosso Ego (de nossa personalidade) mais “terrena” e “mundana” é primordial e mais que necessário.
Parabéns pelo Blog velho. Bem interessante! Ano que vem estou querendo passar para vias mais altas e o ES parece bem legal!
Fala Rafael.
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