Filipe Careli: Homenageado em nova via na Pedra do Pontilhão

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Post atualizado em 03/06/2023: O nome da via foi modificada de Trem das Treze para Filipe Careli. Explico ao final do post.

Escalar na Pedra do Pontilhão é sinônimo de ter ao seu dispôr, uma parede com vias tradicionais à sombra, no período da tarde.

Isso é bem raro no Espírito Santo! E por isso, a Pedra do Pontilhão é lugar bem especial. Sem falar do seu belo e atípico visual.

Só que o que não pode é sair tarde, já no período da tarde, para escalar por lá… Assim como eu e Ghiany fizemos no dia 11/03.

Ghiany Loss na via Filipe Careli, Pedra do Pontilhão. Foto Oswaldo Baldin.

1ª Investida: Hora Tardia

Conquistar essa linha estava nos meus planos há tempos. Só que minhas idas na Pedra do Pontilhão sempre são envolvidas com Escaladas Guiadas. E nessa ocupação, essa conquista foi sempre sendo adiada.

Num sábado recente, já no início da tarde, chamei minha parceira de escalada Ghiany para essa conquista e ela topou na hora! Que bom, finalmente aquela via ia sair da mente e se concretizar… O problema é que fiz o convite sem planejamento e com a hora já tardia.

Até preparar as tralhas de conquista nas mochilas, rodar 30km até lá, caminhar, equipar e começar escalar, já passava das 15h!

Rapelamos à partir da P1 da via Calango para acessar a base da parede. Nossa via sairia ao lado do pilar do trilho, seguindo uma linha bem natural pela fenda. Uma hora essa fenda acabaria, e de lá em diante a via seguiria no padrão local: proteções fixas por lances em agarras.

Baldin no final da primeira enfiada.

Como a parede é relativamente pequena, optei em instalar paradas a cada 30 metros, para que as repetições pudessem rapelar a via com apenas uma corda.

Comecei conquistando a primeira enfiada, bem fácil, margeando a fenda, e quase ao final dos 30m fiz uma proteção com Camalot #1 e sai em diagonal para esquerda, instalando a P1.

Quando a Ghiany foi escalar, existia uma plateia observando do trilho. Foi um camarada que estava lá que inclusive, fez algumas fotos desse post, mas não consegui saber o nome dele.

Ghiany chegando na P1.

Fui para a segunda enfiada, saindo a esquerda da parada, atingindo um degrau que conduz novamente à fenda. Protegi com 2 camalots (#1 e 0.75) a prova de bomba, e ali estava o lance mais legal da fenda. A parede fica mais apruma e dá para passar de algumas formas, inclusive usando a parede da direita como “tesoura”.

Feita a virada, mais um camalot (#2) e fim de fenda! Exatamente no trecho mais vertical da parede, e com alguns lances delicados, pois muita laca e agarras estavam instáveis. Instalei uma chapa, limpei o que deu, e passei com cautela o que viria ser o crux da via (um provável Vsup). Depois mais duas chapas e parei no final de 30m instalando a P2. Esse trecho mais técnico, em agarras, ficou muitíssimo protegido (E1).

A essa hora a penumbra já estava presente, e não dava mais para seguir a conquista. A vontade de terminar era grande, mas esse foi o preço da saída tardia de Vitória. Mas valeu Ghiany, por topar minha proposta de última hora!

2ª Investida: Chapas à Conta

Duas semanas depois (25/03) voltamos. Dessa vez praticando a estratégia padrão de escalar na Pedra do Pontilhão, que opto em sair de Vitória por volta das 11h30. Para assim chegar na parede quando ela está entrando na sombra, que é por volta das 13 horas.

Ao repetir a segunda enfiada acabei limpando mais a parede, jogando o que estava podre e instável para baixo. Eliminei possíveis sustos para as repetições.

Vista do final da via Filipe Careli, 90m. Foto Oswaldo Baldin.

Lá da P1 a Ghiany ficou me fornecendo a segue. Usei a P2 equalizada como ponto único de “costura” – porque recolhi e reaproveitei as costuras para seguir -, e sai para conquistar a terceira e última enfiada.

No rack levei apenas 5 chapas, mais parada, para terminar a via. Chapas em casa tinha aos montes, mas bolts eram apenas 7 no estoque.

Dali pra frente a via seguiria ao estilo Pedra do Pontilhão, com lances em agarras e algumas poucas passadas em aderência.

A linha tendenciosamente foi um pouco para esquerda, pois mirei uma laca bonita (terceira chapa). Aos poucos a parede foi perdendo inclinação e cheguei em 30m exatamente onde pretendia: na base de uma parede vertical, onde instalei a P3. Ali acabara as exatas 7 chapeletas!

Não vi que teria sentido a via seguir adiante, pois essa última parede era baixa, esquisita, e a via terminaria no mato. Sendo assim, a via foi finalizada com 90m, em três enfiadas de 30m.

Conquista finalizada, cupom do açaí liberado!

Sobre o nome da via

No dia 25 de Março, após voltarmos da conquista, Ghiany e eu estávamos pensando em um nome para a via… e o Trem das Treze surgiu! Dando ênfase ao fato da sombra à tarde tornar esse local tão especial para escalar.

Exatos 2 meses depois, no dia 25 de Maio, eu havia agendado de escalar a via Trem das Treze com o cliente e amigo, Filipe Careli. Porém não deu certo, pois eu estava com o braço imobilizado. Cinco dias antes, durante uma conquista nos Três Pontões de Águia Branca, uma pedra despencou de 20 metros e atingiu meu braço. A pancada foi forte, e foi bem trabalhoso rapelar e sair da montanha, foram cerca de 03 horas nesse processo.

Três dias depois após, termos cancelado a escalada, infelizmente o Filipe veio a falecer em um acidente automobilístico.

O Filipe era um jovem escalador do interior do RJ. Toda vez que vinha ao ES a trabalho, dava um jeito de conciliar e combinar uma Escalada Guiada comigo. Desde 2019 era assim, ano em que ele escalou a via “Luz no Fim do Túnel” e ficou admirado com o lugar. Ele tinha uma grande vontade de voltar a escalar na Pedra do Pontilhão, tentamos algumas vezes, mas a chuva impossibilitou. E infelizmente ele não conseguiu voltar a escalar por lá.

Conversando com a Ghiany sobre esses acontecimentos e a triste partida do Filipe, resolvemos mudar o nome da via.

Fica essa homenagem a esse camarada cheio de energia e gente boíssima que a escalada me apresentou, e que eu tive o privilégio de estar junto apresentando-lhe algumas escaladas capixabas. Descanse em paz camarada.

A Escalada

1ª Enfiada: Começa bem fácil margeando a fenda, sem mesmo ter a necessidade de proteger. Em um pé de embaúba pode-se fazer uma ancoragem natural (leve uma fita de 120cm), ou proteja com camalot logo adiante. A uns 25m a fenda fica mais larga, e no fundo proteja com um camalot #1 e saia em diagonal (IIIsup) para esquerda, chegando na P1.

2ª Enfiada: Saindo levemente à esquerda e depois tocando reto atinge-se um degrau/platô. À direita a fenda continua, onde ela faz uma leve barriga e permite proteger com camalots 1 e 0.75. Depois da virada, protege com o #2, até que a fenda termina. Segue então em lances de agarras, protegidos por três chapeletas (E1).

3ª Enfiada: Toda em proteções fixas, predominantemente em agarras e poucas passadas em aderência. Vai para esquerda por três chapas até uma boa laca, e depois a parede vai perdendo inclinação até atingir a P3.

É possível fazer a via em somente 2 enfiadas. Por exemplo, emendando a 1ª com a 2ª enfiada (60m), mais a 3ª com 30m. Mas acredito que fazê-la fracionada, em três pequenas enfiadas de 30m, é mais curtição e dá menos arrasto na corda. Experimenta lá da forma que achar melhor e depois em diga!

Equipo

6 costuras, sendo 2 longas. 1x Camalot #0.75, 1 e 2. 1 corda de 60 metros.

Descida

Com 1 corda de 60m faz 3 rapéis de 30m, em paradas duplas com chapeletas Pingo. As Pingos que instalei lá são uma versão nova da Bonier, com o olhal maior, o que torna o recolhimento da corda mais suave.

Atenção: Para retornar ao túnel, da P1 da via Filipe Careli é preciso fazer o rapel em diagonal/horizontal de 20m até a parada (P1) da via Calango. O primeiro a rapelar/atravessar esse trecho deve ter cautela, e usar um calçado de boa aderência (na dúvida faça de sapatilha). O trecho é fácil, mas um escorregão causará um grande pêndulo! Assim que o primeiro chegar na P1 da Calango, pode fixar a corda para evitar o pêndulo do(s) próximo(s). Para evitar tudo isso, somente se levar 2 cordas de 60m e fizer um rapel da P2 direto para a P1 da Calango, ignorando a P1 da Filipe Careli.

Acesso

A Pedra do Pontilhão fica entre Viana e Domingos Martins, seguindo pela BR-262.

Para não ter erro, a localização pelo Google Maps até o local de estacionar é essa AQUI.

Aproximação

Quando tiver chegando na área de estacionar, olhando o portão da Usina Jucu, sua caminhada de aproximação se dará à direita pelos trilhos. São cerca de 15m, passando um bambuzal, e quando chegar na boca do Túnel, a via Filipe Careli estará na parede da direita, onde também está a parada da via Calango em dois grampos azuis.

Dicas

Recomendo escalar no período da tarde, pois é quando a parede está na sombra. Por volta das 13h a parede começa entrar em sombra. Mas isso varia, dependendo da época do ano.

Detalhes sobre outras vias da Pedra do Pontilhão você encontra na pág. 313 do livro/guia Escalada Capixaba.

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